sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Cinema, cultura e outros fenômenos

Pensando sobre como iniciar uma coluna sobre cinema e cultura em geral, o primeiro dos problemas parece ser: quem vai ler? O interesse pelo tema não acontece por instinto, mas por curiosidade. A palavra “cultura” vem de “cultivar”, e significa modificar a natureza. Mentes cultas não caem do céu – são cultivadas.
O que cai do céu, mas nem sempre nas quantidades desejadas pelo homem, é apenas a água. Aparentemente inofensiva. Só que nos últimos tempos, as chuvas que atingem diversos estados do Brasil tem provocado preocupação, causado enchentes. Pesquisas climáticas indicam que a primavera recém iniciada continuará chuvosa, com índices acima da média. E enquanto algumas regiões sofrem pelo excesso, outras, ou melhor, outra – o sertão nordestino – enfrenta todos os anos o fantasma da seca.
Dentre os muitos filmes que abordam a temática da árida vida sertaneja, um deles merece uma análise mais profunda: Cinema, Aspirinas e Urubus, produzido pela Dezenove Filmes em 2005. Dirigido por Marcelo Gomes, o filme se passa em 1942 e conta a história de Johann (personagem vivido por Peter Ketnath), um alemão que viaja pelo interior do nordeste do Brasil vendendo aspirinas, consideradas na época “o fim de todos os males”. Para promover o remédio, ele usa pequenos filmes de publicidade.
Em sua jornada, Johann acaba conhecendo o andarilho Ranulpho (João Miguel, prêmio de melhor ator nos Festivais Internacionais de São Paulo, Rio de Janeiro, Cuiabá e Guadalajara, no México). Ranulpho é um paraibano que sonha em “tentar a vida” longe da seca, no Rio de Janeiro. Viajando com Johann pelas estradas do sertão, os dois desenvolvem uma amizade que chega a uma encruzilhada quando o Brasil declara guerra contra a Alemanha e Johann precisa decidir se volta a seu país de origem para se alistar ou permanece no Brasil, mas em um campo de concentração.
Cinema, aspirinas e urubus se encaixa no gênero dos filmes conhecidos como road movies (filmes de estrada). Mas é essencialmente uma história de amizade, em uma terra castigada pelo sol que maltrata os olhos e faz doer o coração. O país da propaganda de aspirina é o “Brasil maravilhoso”. O país que Ranulpho conhece como seu é pobre, feio, infame. “Aqui nem guerra chega”, observa. E quando Johann, cansado de dirigir, desabafa que “esse Brasil parece que não acaba nunca”, a resposta de Ranulpho é simples: “lugar que não presta é assim, demora pra acabar”.
A verdade é que, como Ranulpho, estamos todos sempre cansados de alguma coisa. Da seca, quando não chove. Das chuvas, quando chove. Da falta de dinheiro, da política, da violência, até mesmo da falta do que fazer. Aos poucos, o cansaço vai se transformando em preguiça. Uma preguiça perigosa, que é a preguiça de cultivar idéias, de querer coisas novas. E quando menos se espera, a preguiça vira cegueira. Mas esse já é assunto para uma outra crônica (ou livro, ou filme, ou ensaio).

Um comentário:

  1. Simply GREAT! I loved to read it and i'm proud of you sis, as always! Vc sabe como escrever sobre cinema como ninguém! Kisses kisses, Karinha

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